Irmãos Guerreiros
As Oficinas
As oficinas de Capoeira Angola são oferecidas de modo gratuito desde 2015 iniciadas pelo Mestre Chico Porreta (GCAIG), em 2022, com a inauguração de seu próprio espaço, Mestre Chico cedeu o lugar à Contra Mestra Moleza
O Grupo de Capoeira Angola Irmãos Guerreiros
O grupo de Capoeira Angola Irmãos Guerreiros, fundado por Mestre Baixinho e Mestre Marrom, em seus 40 anos de história na cidade de Taboão da Serra, conta com mais de uma centena de membros e muito núcleos de propagação da cultura da capoeiragem na periferia de São Paulo, nos municípios de Embu das Artes, Campinas, Ubatuba, São Bernardos dos Campos e no estado da Paraíba, bem como em Portugal, Alemanha, Noruega e Áustria
Conhecido e reconhecido na região e fora dela, o grupo presta um imenso trabalho oferecendo aulas particulares e gratuitas para diferentes públicos, mas majoritariamente para o povo periférico da região de Taboão da Serra (Sete núcleos são na região)
Mestre Chico Porreta
Da janela do Hospital Geral do Pirajussara em Taboão da Serra, região metropolitana de São Paulo, Francisco olhava o caminhar dos trabalhadores apressados e fazia sua prece silenciosa, “Meus Deus, se um dia eu sair daqui caminhando, vai ser Vida Nova.”
A Vida Nova chegou, não com a rapidez que se espera de uma passe de mágica milagroso, mas depois de um ano de muita sopa, muitos banhos sentados e muitas pernas e braços de seus filhos e esposa, que faziam o que Seu Chico já não podia fazer, se movimentar sozinho. Seu corpo foi respondendo aos tratamentos e ao desejo de voltar à capoeiragem. Em um domingo ensolarado quando seu Grupo de Capoeira Angola, Irmãos Guerreiros, foi visita-lo, fez questão de recebê-los na laje de sua casa, espaço grande o suficiente para fazer uma roda e armar uma bateria. Conforme a vadiagem avançava, Chico pensava “Se Deus me der vida nova, quero passar tudo que sei para frente, pode ser até aqui mesmo, na minha laje”.
O ano era 2007 e Francisco já caminhava sozinho, conseguia treinar algumas vezes por semana e aos poucos voltava ao seu trabalho como pedreiro. O médico, porém, devido à agressividade da doença, lhe dera seis anos de vida. Hoje, dezesseis anos depois, continuamos a celebrar mais um ano de vida nova do Mestre Chico Porreta e temos o prazer de apresenta-lo nesse edital
Atuação na Capoeira
Formado Mestre de Capoeira em 2018 pelo Grupo de Capoeira Angola Irmãos Guerreiros (GCAIG), Seu Chico, como é conhecido chegou em São Paulo em 1973 carregando as vivências de duas décadas como vaqueiro em Itamira (BA), cidade em que nasceu. Desta bagagem trazida da Roça baiana surgiria mais tarde muitas de suas canções, como a famosa “Rede na Balança” – das lembranças dos tempos que sua mãe armava várias redes para Seu Chico e seus irmãos dormirem.
Em 1985, Mestre Chico Porreta ingressa em sua vida como capoeirista no Grupo Cativeiro (Mestre Cavaco), e divide suas tarefas entre o trabalho na construção civil, cuidado com a esposa e os filhos e a venda de alhos na feira de Domingo do Pirajussara. Na feira conhece o GCAIG de Mestre Baixinho e Mestre Marrom que faziam a conhecida Roda da Feira e entre um rabo de arraia e uma cabeçada esquecia os alhos e só lembrava deles quando alguém os encontrava e vinha devolve-los.
Do contato com os Irmãos Guerreiros na Roda da Feira, Seu Chico entra para o grupo em 2000, passando direto para professor e depois Contra Mestre. Uma doença grave o faz passar um mês internado e mais um ano sem poder trabalhar e fazer o que ama - a capoeira. Mas como seu próprio nome diz, Seu Chico é porreta e não se deixa vencer, se recuperou da doença e hoje é um dos 4 mestres do Grupo Irmãos Guerreiros, se tornando conhecido em vários lugares do mundo como capoeirista e autor da canção “Rede na Balança”.
Em 2021, depois de uma vida toda na construção civil, com então 68 anos de idade na época, Chico começa a construir seu espaço de capoeira na laje de sua casa, na periferia de Taboão da Serra. Por meio do incentivo da lei Aldir Blanc, rifas e financiamento coletivo, em 2023 é inaugurada a Casa Nova de Angola, onde Chico ministra treinos de movimentação e musicalidade e confecciona seus berimbaus.
Contra Mestra Moleza
Dona Dina, nascida em Jacobina, Bahia, veio pra São Paulo há 60 anos e aqui teve suas sete filhas. Criou as sete meninas na periferia de Taboão da Serra com seu marido, Seu Poli. A casa, conhecida como a Casa das sete mulheres, funcionava como a maioria das residências de periferia até hoje, as mais velhas cuidavam das mais novas para os pais trabalharem. Já com 15 anos era comum as mães arranjarem algum emprego para as suas filhas em casas de família. Paula, a segunda filha das sete meninas, iniciou sua trajetória dessa maneira.
Sempre moradora de Taboão da Serra, Paula, assim como todos os jovens da época, não via em sua realidade grandes perspectivas de melhora até que em 1998, sua curiosidade lhe despertou para a capoeira. Pernalonga, alcunha de seu vizinho, passava sempre com atabaques e berimbaus na frente da casa das sete mulheres. O pulsar dos instrumentos, despertou em três delas a vontade de conhecer o lugar onde eram tocados. E esse foi o primeiro encontro de Paulinha e suas irmãs com a capoeira, as três, logo se apaixonaram pelo mundo novo mundo que se apresentava a elas. Porém, a paixão repentina foi seguida de uma tragédia com a morte de Seu Poli. As dificuldades financeiras e emocionais, no entanto, não impediram as irmãs de continuarem na capoeira. A dedicação era tanta que chegavam a treinar nos períodos da manhã, da tarde e da noite, quando não treinavam também em algumas madrugadas.
Há 25 anos, quando essa história se iniciou, o poder público não se interessava pelas regiões periféricas como Taboão da Serra que contava com grandes morros de terra cuja poeira tingia o interior das casas de marrom. Marrom também é o nome do Mestre de Capoeira, professor de Pernalonga, que conheceu algumas dessas meninas que encontraram no jogo-luta a força e resistencia de seus ancestrais afro-brasileiros e a possibilidade de escrever uma nova história para as suas vidas. Resistência também é o apelido de José Eustáquio, homem que, junto com a capoeira, cativou Paula e com ela tem dois filhos. Em 2009, Paula e Resistência tiveram Luiza Flor e em 2015, Davi.
A maneira meticulosa com a qual Paula gostava de aprimorar seus movimentos, lhe deu a alcunha de Moleza. Esse apelido, porém, em nada se relaciona com lerdeza ou ociosidade, já que Moleza sempre teve que conciliar sua paixão pela capoeira com a manutenção da vida material e o cuidado com seus filhos. Sabe-se que, culturalmente, as mulheres tem mais dificuldades de permanecer na capoeira pelas demandas sociais a que são cobradas, como o cuidado com a casa e com os filhos, Paula, no entanto, insistiu em seu sonho e apesar de todas as dificuldades se formou Contra Mestra de Capoeira Angola no início de 2023.
Conhecida por sua simpatia, acolhida e por sua posição afirmativa em relação às mulheres dentro e fora da capoeira, a Mestra é reconhecida pela comunidade capoerística que a convida para rodas de conversa, eventos e treinos de movimentação e musicalidade.
Não obstante a participação em eventos e treinos, Paula ainda não tinha um trabalho solo no grupo de Capoeira Irmãos Guerreiros até 2022, quando foi convidada pelo Mestre Chico Porreta de seu grupo a ministrar as aulas de Capoeira Angola em seu lugar no espaço cultural Cita.
Hoje, além de sempre atender aos convites para os eventos e ministrar os treinos e rodas de conversa, a mestra tem seu trabalho individual onde ensina gratuitamente jovens e adolescentes da região do Taboão da Serra e do bairro do Campo Limpo em São Paulo. O espaço cultural, no entanto, depende de políticas públicas para remunerar os oficineiros, e neste ano as aulas continuam acontecendo, porém sem nenhum tipo de ajuda de custo. Por isso se faz importante editais como este para a valorização e remuneração de atores culturais que prestam um serviço de valor inestimável para a cultura brasileira

















